quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

Aniversário da revolução cubana, seu alcance e seus limites

 https://convergenciadecombate.blogspot.com/2023/01/aniversario-de-la-revolucion-cubana-sus.html

Por Juan Giglio


Fidel Castro era membro do Partido Popular Cubano (Ortodoxo), uma organização nacionalista burguesa criada em 1947 por Eduardo Chibas Ribas, que não propunha medidas socialistas, mas sim a limitação das ações dos monopólios ianques e a luta contra a corrupção administrativa no Estado, daí que seu principal símbolo fosse a vassoura.

 

Em 1952 Fulgêncio Batista tomou o poder através de um golpe de Estado e, em 1955. Sob a liderança do irmão de Chibas - que havia cometido suicídio - foi realizado um congresso dos militantes de seu partido, estimulado pela juventude, ao qual pertenciam Fidel e seu "Movimento 26 de Julho", que acabou impondo uma linha insurrecional para pôr fim à ditadura.

 

Em 26 de julho de 1953, Fidel havia comandado uma operação para invadir o quartel de Moncada em Santiago de Cuba, razão pela qual o grupo que ele liderou acabou adotando esse nome. O assalto falhou e seus líderes foram feitos prisioneiros. Fidel Castro foi anistiado em 1955 e passou a organizar a M26-J na clandestinidade.

 

Vindo do exílio mexicano, em 1956 o grupo - no qual Ernesto "Che" Guevara já estava como um militante - entrou clandestinamente na ilha, estabelecendo sua sede na Serra Maestra, comandando uma intensa luta armada que, quando combinada com as mobilizações e greves urbanas gerais, acabaria por derrubar Batista no final de 1958.

 

Guerra de guerrilha, greve geral e o triunfo da Revolução

 

A viagem a Cuba foi feita a bordo de um iate chamado Granam, que transportava 82 guerrilheiros do M-26-J que desembarcaram na área de Casulos, perto da praia de Lãs Coloradas, na parte leste da ilha. O grupo, que se estabeleceu nas encostas da Serra Maestra, não teve muita sorte e acabou sendo reduzido a 20 pessoas.

 

Porém, depois disso, em 1 de janeiro de 1959, forças lideradas por Fidel Castro entraram vitoriosos em Santiago de Cuba, obrigando o ditador Fulgêncio Batista a fugir para os EUA. Uma semana depois, em 8 de janeiro, uma greve geral derrotou as manobras da ditadura, facilitando a entrada do Exército Rebelde em Havana, que foi saudada por uma imensa multidão.

 

Naquela época, Cuba enfrentava uma grave situação devido à queda na demanda de seu principal produto de exportação, o açúcar, bem como uma tremenda dependência econômica e política do imperialismo norte-americano, dono de tudo, tais como as "empresas" relacionadas à prostituição e ao jogo, que pertenciam à máfia.

 

Em 1958, a mortalidade infantil era de 60 crianças a cada 1000 nascidos vivos, o analfabetismo era superior a 30% e os sem-teto atormentavam os habitantes das cidades. No campo, os latifundiários exploravam despoticamente uma gigantesca massa de camponeses e trabalhadores rurais despossuídos.

 

O programa original dos revolucionários limitou-se a tomar o poder para restaurar a constituição burguesa de 1940, juntamente com uma tímida reforma agrária para aliviar um pouco a terrível situação do campesinato. Para conseguir isso, o M26 viu a necessidade de um governo de unidade com o resto das forças capitalistas adversárias.

 

Entretanto, a fraqueza do imperialismo, que naquela época havia concentrado toda sua atenção e poder na guerra da Coréia, mais a pressão da luta dos trabalhadores e camponeses, forçou o M26 a se radicalizar, levando-o a apresentar a necessidade de reformas agrárias muito ousadas e a expropriação de propriedades imperialistas.

 

Outro elemento importante foi a destruição - através da guerrilha e da greve geral de cinco dias antes da tomada de Havana - do exército regular, que foi substituído pelas milícias do Exército Rebelde, que não era composto pelos filhos dos capitalistas como os antigos oficiais, mas de camponeses rurais, trabalhadores e camponeses.

 

A radicalização objetiva do processo cubano assustou a burguesia e o imperialismo, que inicialmente havia olhado com simpatia para os "barbudos". Decidiram, portanto, boicotar o governo, forçando-o a virar-se para a esquerda. O atrito começou a se desenvolver com a criação dos tribunais revolucionários e a redução de aluguéis e tarifas.

 

Reforma agrária, expropriações e uma "contra-revolução".

 

A relação com o imperialismo tornou-se tensa em maio de 1959, quando a Lei de Reforma Agrária foi aprovada, razão pela qual o presidente Urrutia expulsou Fidel Castro de seu posto governamental. A mobilização dos trabalhadores e camponeses o restituiu ao cargo, o que forçou Urrutia a renunciar, deixando-o para o Exército Rebelde.

 

Ernesto Guevara definiu tudo isso como uma "Contra-Revolução", explicando-a como um processo no qual cada vez que os ataques da burguesia nacional e internacional eram respondidos, o governo era pressionado a romper com os capitalistas. Enquanto isso, a mobilização dos trabalhadores e do povo multiplicou esta pressão.

 

Em 29 de junho de 1960 a Texaco foi expropriada, e em 1 de julho a Esso e a Shell foram expropriadas (no mesmo mês os EUA suspenderam a compra de açúcar de Cuba como pressão econômica). Em agosto, todas as empresas americanas dos setores de petróleo, açúcar, telefone e eletricidade foram nacionalizadas.

 

Em outubro, os bancos (nacionais e estrangeiros) e quase 400 grandes empresas (usinas de açúcar, fábricas, ferrovias) são nacionalizadas e a Lei de Reforma Urbana é aprovada, dando a milhares de inquilinos a propriedade de suas casas. Os Estados Unidos continuaram a exercer pressão em todas as áreas e Cuba começou a apoiar-se na União Soviética.

 

Em janeiro de 1961, os Estados Unidos romperam relações com Cuba e em abril a CIA organizou a invasão de exilados, ou gusanos, na Baía dos Porcos. As milícias, nas quais o trotskista argentino Bengoechea e um grupo de militantes enviados por Nahuel Moreno lutaram, derrotaram a invasão, após a qual foi proclamado o caráter socialista da revolução. 

 

Apesar de tudo isso, a Revolução não deu origem a um Estado dirigido pelos trabalhadores e pelo povo através de órgãos democráticos - como foi a Assembleia da Comuna de Paris de 1871 ou os sovietes russos de 1917-1924 - mas um governo com características burocráticas, apoiado pela forte autoridade de Fidel Castro e seu irmão Raul Castro.

 

Isolamento, dependência da ex-URSS e contradições com Che Guevara

 

Devido ao isolamento e à escassa capacidade produtiva, o castrismo teve que contar com os burocratas da ex-URSS, dos quais começaram a depender economicamente, o que facilitou a tarefa dos comunistas russos, que acabaram assumindo a Revolução, conquistando a maioria dos comandantes para sua concepção de "Revolução por Etapas" e de "Coexistência com o Capitalismo".

 

Esta teoria colidiu, de fato, com a teoria defendida por Che Guevara, que apelou publicamente à vanguarda para fazer "Um, Dois, Três Vietnãs". Não é por acaso que o guerrilheiro caiu na Bolívia - carregando o livro de Trotsky A Revolução Permanente em sua mochila!

 

Uma das anedotas contadas pelo revolucionário internacionalista Ángel Bengoechea, confiada a seu amigo Horacio Lagar, foi que, após a batalha da Baía dos Porcos – onde Bengoechea “El Vasco” lutou com um braço quebrado - Guevara parabenizou calorosamente os argentinos que estavam treinando na ilha e lutaram contra os gusanos: "Se ser trotskista é ser como "Vasco"... Eu também sou trotskista" (Testimonios de Horacio Lagar, Editorial El Trabajador).

 

A adesão do aparato comunista cubano às teorias dos burocratas da URSS foi fatal para o governo revolucionário, que, após a morte de Che, retardou sua extensão e começou a dar passos avançados rumo à restauração capitalista, que hoje está praticamente consumada.

 

Os acordos com Obama para a introdução de empresas imperialistas em Cuba foram um golpe devastador e definitivo, um revés econômico que teve seus marcos políticos nos anos 70 no Chile e nos anos 80 na Nicarágua, quando naqueles países estavam se desenvolvendo as condições para o triunfo de uma nova revolução de caráter socialista.

 

Usando todo seu prestígio, a liderança cubana recomendou às massas chilenas, que "não construíssem uma nova Cuba", ou seja, que "não expropriassem os capitalistas" e nem destruíssem seu exército, que finalmente derrubou Allende através de um golpe de Estado.

 

Quando, no final dos anos 70, os trabalhadores e o povo da Nicarágua derrotaram a ditadura de Anastasio Somoza com uma combinação semelhante ao processo cubano -guerrilha, greves gerais e uma ruptura das Forças Armadas- Fidel dirigiu-se ao povo vitorioso para repetir o que havia dito no Chile: "Não façam como em Cuba".

 

O governo da Frente Sandinista de Libertação Nacional, cooptado para a ideologia estalinista, abortou qualquer possibilidade de avançar para expropriações e para a realização de uma reforma agrária, transformando-se ao longo dos anos em um governo tradicional burguês, que defende consistentemente os interesses dos empresários nacionais e imperialistas.

 

Isto não foi coincidência, pois Fidel, antes dos acontecimentos no Chile e na Nicarágua, tinha apoiado fervorosamente a invasão dos tanques soviéticos na Tchecoslováquia (1968), que era para esmagar a "Primavera de Praga", uma revolução operária e popular contra a burocracia estalinista, em favor da democracia direta e do socialismo.

 

Fidel Castro apoiou o golpe de Estado do general Jaruzelsky na Polônia em 1981, contra os trabalhadores que estavam construindo seus novos sindicatos democráticos, chamados Solidariedade. O argumento foi o mesmo que ele usou na Tchecoslováquia, ou seja, que seria para "defender o socialismo", que disso não tinha nada além do nome.

 

Fidel retrocedeu tanto que, recordando seus primórdios como jovem ativista do Partido Ortodoxo e do Catolicismo, acabou ajoelhando-se diante da instituição mais reacionária da humanidade, a Igreja Católica Apostólica Romana, através de cuja mediação promoveu a rendição incondicional das FARC na Colômbia.

 

Do regime cubano também apoiaram e apoiam o governo do falso socialismo venezuelano e o ditador sanguinário da Síria, Bahsar Al Assad, assassino de centenas de milhares de compatriotas, unindo-se para esta cruzada genocida ao representante do imperialismo russo, o "Czar" Vladimir Putin, que fornece à ditadura aviões e armas de destruição em massa.

 

Apesar disso, e apesar das críticas, não podemos e não devemos deixar de justificar o heroísmo dos guerrilheiros que desceram da Sierra Maestra e, pressionados pelas circunstâncias, foram forçados a construir uma revolução que foi além do que eles pretendiam. Devemos, portanto, aceitar, aprender e socializar suas melhores lições. 

 

Tudo isso deve tornar-se um guia para os trabalhadores que lutam contra seus patrões e governos, um exemplo que demonstre a possibilidade concreta de derrotar os imperialistas, mostrando que as medidas socialistas são capazes de resolver problemas elementares que o capitalismo não pode mais resolver!

 

Viva a Revolução, aprendamos com seus limites!

 

Como admiradores de Che Guevara, que além de seus limites e contradições foi quem mais tentou fazer a revolução, estendendo-a ao resto do planeta, continuaremos a lutar pela unidade dos revolucionários para criar partidos que sejam guiados pela estratégia de construção do poder democrático operário e popular, promovendo os órgãos de autodeterminação e autodefesa das massas, tais como as assembleias populares, as coordenadoras, os conselhos de trabalhadores ou os sovietes.

 

O socialismo não se reduz à imposição de medidas de natureza expropriatória ou estatista - que são muito importantes - mas à possibilidade do movimento de massa se sentir capaz de exercer o poder através da construção da principal ferramenta que existe para que isso aconteça: a democracia direta.

 

Os processos revolucionários em curso, como a explosão dos "coletes amarelos" na França, estão mostrando esta perspectiva, já que os novos processos de luta se baseiam no mecanismo de montagem, que é, no final, a semente do poder operário e popular.

 

Por todas estas razões, no 60º aniversário da Revolução Cubana, nós revolucionários devemos gritar em voz alta: Viva a Revolução de 1959! Com seus ensinamentos e críticas, estamos agora indo para mais revoluções, construindo organizações revolucionárias consistentes que impulsionem a democracia direta da classe trabalhadora e do povo em luta!

 

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