Por João Evangelista
Nesta
terça-feira (11), a Câmara de Deputados, o bloco formado por congressistas da
burguesia tradicional e da oposição bolsonarista de extrema direita com
tendências neo-fascistas aprovaram em regime de urgência o Projeto de Lei
1904/24, que equipara a realização de aborto após a 22ª semana de gestação ao
crime de homicídio. O regime de urgência aprovado apressadamente pelo
presidente da câmara, Arthur Lira, significa que não precisa passar pelas
discussões e análises das comissões da Câmara Federal, podendo ser levado à
votação diretamente no Plenário, a qualquer momento.
O
projeto, que é de autoria do deputado bolsonarista Sóstenes Cavalcante do Partido
Liberal-PL, além de proibir o aborto a partir de 22 semanas de gestação nas
situações previstas atualmente por lei (Em casos de estupros, anencefalia ou
risco de morte para a pessoa gestante), ainda eleva a pena de prisão para a
mulher que realizar o procedimento para 20 anos de prisão. Para se ter uma
ideia da aberração, a pena máxima de prisão para quem cometer estupro é de 10
anos. Ou seja, a pena para o estuprador seria menor do que a pena para a vítima
do estupro. Por isso, a população já denominou tal projeto de “Projeto do
Estuprador”.
A
aprovação do regime de urgência na Câmara causou grande repercussão nacional e mobilização
imediata nos movimentos em defesa das mulheres, e na mesma noite aconteceram
manifestações de protesto com milhares de pessoas em algumas das principais
cidades do país, principalmente São Paulo e Rio de Janeiro. E estavam
programados mais protestos nesse último fim de semana em defesa da vida,
dignidade e liberdade das pessoas que gestam.
Só para
ter uma ideia da aberração desse projeto, se for aprovado, haverá um conjunto
de punições mais altas para a interrupção da gravidez no Brasil do que a de
alguns países e territórios, como por exemplo o Afeganistão, governado pelo
Talibã, e à Síria. Na Síria, governada pelo regime totalitário de Bashar
Al-Asad e em guerra civil desde 2011, a pena é ainda menor: entre 6 meses e 3 anos
de prisão para mulheres que abortem fora da lei, de acordo com um relatório do
escritório de Direitos Humanos da ONU com base no Código Penal.
Esse
projeto, elaborado pelo grupo de parlamentares bolsonaristas adeptos
fundamentalismo cristão evangélico, faz parte de uma tentativa para
paulatinamente transformar o país num regime teocrático cristão, com modelo da
Idade Média. Tal projeto de lei é um enorme retrocesso para os direitos sexuais
e reprodutivos das mulheres e tramita num momento em que o país registra um dos
seus maiores índices de estupros em geral, inclusive estupros de vulneráveis,
como crianças e adolescentes. Em 2022, nada menos que 74.930 meninas e mulheres
foram vítimas de violência sexual, sendo que 6 em cada 10 vítimas, tinham até
13 anos de idade, com os agressores na maioria dos casos sendo familiares e
conhecidos.
A
realidade é que o acesso das vítimas de estupro aos serviços especializados e
autorizados por lei ao aborto são extremamente dificultados, principalmente aos
mais pobres e as que moram nas regiões mais interioranas, que acabam tendo
acesso ao serviço (quando conseguem chegar) já em estágios mais avançados de
gestação. A medida, portanto, levará que essas mulheres e meninas sejam
duplamente vitimizadas: (1) pelo crime que sofreram e (2) por terem seu direito
ao aborto negado porque não conseguirem acessar os serviços de aborto legal a
tempo de realizarem o procedimento antes das 22 semanas de gestação.
O
presidente Lula, que estava em viagem pela Europa, demorou exatamente 1 semana
para se pronunciar, afirmando ser contra o aborto, mas condenando o teor do projeto
por beneficiar os estupradores. O presidente não se dá conta que independente
de sua posição conciliadora com o conservadorismo religioso fundamentalista,
ele definitivamente não tem o apoio da maioria desse setor reacionário da
sociedade e que novas tentativas de aprovar projetos absurdos continuarão.
Nós da
Corrente Comunista Revolucionária reafirmamos a nossa posição de defesa do
livre direito ao aborto. Entendemos que essa luta é coletiva.Essa luta não pode
ser somente do conjunto das mulheres, mas de toda sociedade. Não podemos
aceitar e tampouco ficar imobilizados diante desse enorme ataque. É preciso
urgente organizar a luta e a resistência para impedir que a votação desse Projeto
de Lei se concretize!